![]() |
| Foto: Reprodução |
Aos 22 anos, Amanda Mello está
no terceiro ano de medicina. Ela trocou Cuiabá por Buenos Aires para seguir o
sonho de ser médica. Mas, na metade do caminho, vieram os aumentos do custo de
vida na Argentina e, sobretudo, da mensalidade.
“Quando saí da minha cidade,
eu tinha a intenção de vir para a Argentina para me formar. Atualmente, com a
situação que está, a faculdade em particular e o custo de vida em geral, tive
de refazer os planos porque aqui não está dando mais para continuar",
lamenta Amanda num desabafo à RFI.
Amanda está de mudança para o
Paraguai, onde vai continuar seus estudos de medicina. “O Paraguai conseguiu
abrir as portas para mim do mesmo jeito que a Argentina abriu há dois anos,
porém com um custo de vida menor e com uma faculdade muito boa”, compara.
Seis mil sob maior risco
Segundo um relatório do
Ministério do Capital Humano da Argentina, com base nos números mais
atualizados disponíveis de 2022, existem 20.255 estudantes brasileiros de
medicina no país, dos quais 12.131 estão matriculados no sistema público
de educação.
Dos restantes 8.124, cerca de
6 mil estão na universidade Barceló, onde os brasileiros ocupam 75% das vagas,
segundo o centro de estudantes da faculdade.
Numa das três sedes da
universidade, a situada em Santo Tomé, na fronteira com a cidade gaúcha de São
Borja, a Barceló já cobra 25% a mais se o estudante for de nacionalidade
brasileira.
A situação chegou ao limite,
e, com isso, milhares de estudantes que habitam em Buenos Aires decidiram
protestar.
A inflação implica nos
aumentos
O índice de preços ao
consumidor desde janeiro deste ano é 106,98% e deve fechar o ano abaixo de
120%, mas os aumentos na Barceló quase triplicaram essa cifra (325%).
Para muitos, o sonho de ser
médico ficou para trás. É o caso do baiano Ario Santos, de 42 anos, que
decidiu voltar para Vitória da Conquista, sua cidade natal, depois de três anos
de estudos na Argentina.
“O que eu vou fazer agora é
trancar minha faculdade aqui, voltar para o Brasil, esperar um pouco mais para
ver se melhora a condição cambial daqui e, se isso acontecer, eu volto para
continuar a minha faculdade. Porque eu estou no terceiro ano, já é um pouco
mais da metade, eu não posso perder o que eu já investi”, explica Ario Santos à
RFI.
“Hoje, com R$ 8 mil, está
difícil você conseguir pagar tudo. Então, eu creio que aumentou 300% ou até
350%. É uma coisa incrível. Ninguém pode pagar isso. Por isso, a maioria dos
brasileiros está voltando”, acrescenta.
Entretanto, este ano a moeda
argentina foi a que mais se valorizou no mundo. E o custo de vida para os
estudantes brasileiros mais do que triplicou em reais.
Apesar da inflação acumulada
desde dezembro — quando o governo do presidente Javier Milei começou — ter
atingido 160%, o valor do dólar financeiro (usado pelos brasileiros) é apenas
7% maior, quando comparado com o de dezembro de 2023.
Na contramão, em 2024, o real
se desvalorizou 19,2% e o dólar aumentou 23,7% no Brasil, tocando os 6 reais.
Essa equação de peso argentino
valorizado e de real desvalorizado atinge o poder aquisitivo dos brasileiros
que recebem a ajuda da família no Brasil.
Há um ano, o curitibano
Matheus Vieira, de 26 anos, pagava o equivalente a R$ 700 de mensalidade; hoje,
paga R$ 1.900, quase o triplo. Com aluguel, transporte e alimentação, o custo
de vida chega a R$ 5 mil e continua a subir todos os meses.
Depois de dois anos na
Argentina, Matheus admite que agora também está na dúvida sobre voltar ao
Brasil ou recomeçar no Paraguai.
“Diante desse panorama, com os
aumentos mensais da faculdade e com o aumento do custo de vida, infelizmente as
opções são trancar a faculdade, voltar para o Brasil ou estudar a possibilidade
de transferir para o Paraguai", lamenta o estudante.
Interrupção e recomeço
A paulista Mikaela Bessa, de
20 anos, indica à RFI que "vai jogar no lixo os dois anos investidos"
na universidade privada Barceló, mas não vai desistir do sonho. Como na
Argentina, a universidade pública não reconhece o estudo da privada, Mikaela
vai recomeçar do zero.
“O impacto desse aumento na
minha vida é que eu terei de recomeçar. Vou ter de trancar, parar a faculdade
no meu segundo ano. Ou seja: são dois anos que paguei a faculdade, que eu me
esforcei, jogados no lixo. E vou recomeçar numa universidade pública aqui na
Argentina para continuar o meu sonho e não ter de desistir e voltar para o
Brasil”, resigna-se.
A também paulista Iasmin
Riboski, de 21 anos, olha ao redor e vê como o sonho se tornou um pesadelo para
os brasileiros e para as suas famílias no Brasil que arcam com os custos.
“Eu tenho a minha família no
Brasil. Os meus avós, já aposentados, e os meus pais, que também estão dando
todo o esforço possível. É muito complicado porque a gente vem com um sonho e
volta com uma ilusão de que a vida é barata, de que a faculdade vai nos
escutar, mas, infelizmente, esse sentimento de frustração não é somente meu,
mas de todos os meus colegas e de todos os estudantes aqui”, aponta Iasmin
sobre o caso de brasileiros nas universidades privadas argentinas.
Fonte: G1

Postar um comentário