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Foto: Reprodução |
Segundo a denúncia do
Ministério Público do Ceará, estão incluídos outros crimes como extorsão e
tráfico de drogas. Os promotores pediram as prisões dos policiais que
atualmente estão lotados em diversas delegacias.
O Grupo de Atuação Especial de
Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) do Ministério Público do
Ceará (MPCE) denunciou 26 policiais civis do Ceará e outras seis
pessoas (lista abaixo) por participarem de um esquema que envolvia
crimes como tortura, tráfico de drogas, corrupção, extorsão, abuso de
autoridade, peculato, prevaricação e associação criminosa. Dentre os acusados há duas
delegadas que durante anos estiveram à frente da Delegacia de Combate ao
Tráfico de Drogas (DCTD).
A reportagem do Diário do
Nordeste teve acesso à denúncia, que é parte de uma investigação sigilosa. A
peça de 298 páginas é assinada por seis promotores e traz detalhes do esquema.
Segundo o órgão ministerial, policiais civis e informantes populares faziam
parte de uma "estrutura ordenada e institucionalizada, com diferentes
níveis de relacionamento e de distribuição de tarefas, direcionada à obtenção
de vantagens" o que, quando é feito de forma ilícita, se configura como
organização criminosa.
A investigação durou pelo
menos três anos e a denúncia foi apresentada no último dia 18 de agosto de
2021. Dentre os pedidos feitos pelo MP ao Poder Judiciário estão requerimentos
de busca e apreensão nas residências dos denunciados, suspensão do exercício de
função pública direcionada aos agentes (alegando que os acusados possuem
grande influência no Sistema de Segurança Pública do Ceará), quebra do
sigilo telemático dos materiais apreendidos, afastamento do sigilo bancário e
fiscal e até mesmo prisões.
A Assessoria Jurídica da
Associação dos Delegados de Polícia do Ceará (Adepol), que faz a defesa das
delegadas denunciadas, representada pelo advogado Leandro Vasques, disse que
vai aguardar ter acesso aos autos para se pronunciar objetivamente sobre a
denúncia. "Somente quando nossas constituintes forem citadas iremos
rebater uma a uma as acusações. Acreditamos que um grave ruído de comunicação
possa estar havendo. Para ficar num solitário exemplo: Interpretações elásticas
de diálogos de WhatsApp são um convite ao fazimento de injustiças", disse
Vasques, que completa "as delegadas denunciadas sempre pautaram suas ações
na régua da estrita legalidade".
Por nota, o Sindicato dos
Policiais Civis do Ceará (Sinpol/CE) disse ter protocolado pedido de acesso ao
processo para tomar conhecimento dos fatos. Conforme o coordenador jurídico do
Sindicato, Kaio Castro, até o fim da tarde dessa quarta-feira (22), eles não
tinham conhecimento de nenhuma decisão judicial que tenha recebido ou não a
denúncia do Ministério Público. "O que sabemos é que o processo se
encontra em sigilo e até o presente momento não foi deferida a nossa
habilitação e não temos como nos manifestar", disse.
LIDERANÇA
Para os promotores, a
liderança da organização ficava a cargo da delegada
Patrícia Bezerra e do inspetor-chefe Petrônio Jerônimo dos Santos, o
'Pepeu'. A dupla já foi condenada
pela Justiça Federal no ano passado em decorrência da Operação Vereda
Sombria, que apurou crimes como corrupção, tortura e associação criminosa.
Ainda não há informações se
mandados foram expedidos e cumpridos. O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) foi
procurado, mas não emitiu posicionamento oficial até a publicação desta
reportagem. O documento do Gaeco é dividido em 26 fatos, todos eles datados nos
anos de 2016, 2017 e 2018, em Fortaleza e Região Metropolitana.
Consta nos autos que os
policiais civis se aproveitavam de informações privilegiadas obtidas por meio
de informantes ou durante as investigações. Assim, eles abordavam suspeitos
específicos para que apreendessem grande quantidade de drogas.
Devido ao modus operandi dos
policiais, os suspeitos se tornavam vítimas de extorsão e eram obrigados e
pagarem quantias de valores diversos. Segundo o MP, a prática acontecia com a
conivência e proteção das delegadas da Especializada.
COMO OS CRIMES ACONTECIAM
De acordo com o Gaeco, o
abordado flagrado com algum objeto ilícito ou mandado judicial em aberto era
extorquido até mesmo sob tortura, ameaçado ser preso em flagrante para que
entregasse alguma informação sobre traficantes maiores e mais quantidade de
drogas.
"Para garantir o esquema
do grupo, os delegados se desdobravam no atendimento às exigências dos
inspetores, seja para livrar algum informante naquelas situações que, de alguma
forma, fugiram ao controle, seja para livrar e proteger os próprios policiais
que participavam das operações, tendo à frente a pessoa de Petrônio Jerônimo
dos Santos", segundo trecho da denúncia.
Conforme MPCE, enquanto os
delegados conseguiam elogios junto à cúpula da Segurança Pública, os inspetores
conseguiam as vantagens financeiras ilícitas. "Ao fecharem os olhos para
os abusos cometidos, os delegados podiam contar com policiais altamente
motivados e proativos"
Os promotores ainda detalham
na acusação que uma característica marcante da organização criminosa delatada é
a tentativa de blindagem dos seus membros toda vez que algum fato criminoso
operado por eles levantava suspeita ou virava alvo de investigação.
O segundo escalão da organização criminosa, conforme o órgão ministerial, era composto por Anna Cláudia Nery, lotada na Delegacia da Mulher e que investiga o caso de racismo contra a delegada Ana Paula Barroso, e Antônio Chaves Pinto Júnior, conhecido como 'AJ'. Anna Nery era quem, para o MP, exercia ao lado de Patrícia Bezerra a função de garantir as torturas e até mesmo possibilitar encontros entre investigadores e informantes.
"A cada passagem
destacada no relatório técnico fica evidente que Anna Cláudia tinha pleno
conhecimento das condutas sorrateiras praticadas pelos seus policiais, pelo
menos no que diz respeito, para além do uso escuso de informantes, ao cotidiano
uso de torturas e agressões físicas como forma de se obter informações, e
assim, facilitar grandes apreensões"
TORTURAS
Consta na denúncia que em maio
de 2017 foi identificada uma sequência de mensagens que tinham como pano de
fundo a apreensão de quatro quilos de drogas, com informações levantadas pelo
setor de análise de interceptações da DCTD. Os policiais Alex Sales e Rafael
Domingues participaram da ocorrência e chegaram a um local onde o entorpecente
estaria escondido. Os diálogos entre os servidores lotados na Especializada
deram conta que havia a possibilidade do traficante investigado ser agredido
física e psicologicamente pelos agentes.
Alex gravou um áudio dizendo
que o traficante, conhecido como 'Tota' havia tirado a droga e escondido em
outro local e os policiais não estavam encontrando. Foi então que Anna Cláudia
Nery teria afirmado de forma categórica que: "Então bota ele pra cuspir,
porque ele disse que ia entregar".
Patrícia pergunta pouco tempo
depois no que deu. O policial Airton diz que "tão na peia" e Anna ri.
Em seguida Alex fala: "tá clareando, coisas boas virão". Então a
delegada titular complementa dizendo: "Claro que esse fedorento aí, nas
mãos do Alex e do Rafael juntos, ouviu a voz do anjo da morte... mas é isso
mesmo, a gente colhe o que planta, ne?" (sic).
Os policiais instigavam a cada
operação o que chamam de S.A.C.O: "Sistema Avançado de Conversação
Objetiva". Um jargão que indica o uso de filmes plásticos como objeto de
tortura através da sufocação para obter informações.
O MPCE destaca que a
organização criminosa era, em sua maioria, composta por policiais civis,
pessoas que têm fé pública e que deveriam trabalhar para proteger a sociedade,
resultam em "um efeito deletério em todo tecido social".
A denúncia do Gaeco ainda
pontua que a maior parte dos denunciados já constam em outros processos
criminais ou investigações, justificando que se continuarem soltos trarão
riscos para a instrução processual e podem causar prejuízos à ordem pública.
"Só a decretação da
medida cautelar de afastamento das funções, não será suficiente para impedir a
continuidade dos crimes praticados pelos denunciados, exemplo claro disso foi o
comportamento adotado pela denunciada Patrícia Bezerra, que três dias após ter
sido deflagrada a operação Veredas, criou um grupo de Whatsapp denominado de 'O
jogo só começou' para se articular com os demais denunciados e criar
estratégias para prejudicar o processo, bem como a adoção de condutas
direcionadas contra autoridades e órgãos públicos, sem falar da natureza
permanente do crime de integrar organização criminosa", disse o Gaeco em
trecho da denúncia.
QUEM SÃO OS DENUNCIADOS E ONDE
ELES ESTÃO ATUALMENTE:
Anderson Rodrigues da Costa,
inspetor, Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco)
André de Almeida Lubanco,
escrivão, escrivão, 10º Distrito Policial
Anna Cláudia Nery da Silva,
delegada, Delegacia de Defesa da Mulher de Fortaleza
Antônio Chaves Pinto Júnior,
inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Antônio Henrique Gomes de
Araújo, inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Antônio Márcio do Nascimento
Maciel, inspetor, Departamento de Informática
Cristiano Soares Duarte,
inspetor, 12º Distrito Policial
Edenias Silva da Costa Filho,
inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos (DRF)
Eliezer Moreira Batista,
inspetor, Gabinete da Superintendência da Polícia Civil
Fábio Oliveira Benevides,
inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Fabrício Dantas Alexandre,
inspetor, Departamento de Polícia Judiciária Especializada
Francisco Antônio Duarte,
recolhido no Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC) *(não é
policial)
Francisco Alex de Souza Teles,
inspetor, Departamento de Recursos Humanos
Gleidson da Costa Ferreira,
inspetor, Departamento de Polícia Judiciária Especializada
Harpley Ribeiro Maciel,
inspetor, 5º Distrito Policial
Ivan Ferreira da Silva Júnior,
inspetor, 8ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP)
João Filipe de Araújo Sampaio
Leite, delegado do Piauí, ex-inspetor da PCCE.
José Abdon Gonçalves Filho,
recolhido no Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC) *(não é
policial)
José Airton Teles Filho,
inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC)
José Amilton Pereira Monteiro,
inspetor, 8º Distrito Policial
José Audízio Soares Júnior,
inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
José Ricardo do Nascimento,
recolhido no Centro de Execução Penal e Integração Social Vasco Damasceno Weyne
(Cepis) *(não é policial)
Karlos Ribeiro Filho,
inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC)
Madson Natan Santos da Silva,
inspetor, Coordenadoria de Operações e Recursos Especiais
Marcos Vinícos Alexandre
Gonçalves, em liberdade endereço não confirmado *não é policial
Patrícia Bezerra de Souza Dias
Branco, delegada, Assessoria Jurídica da Polícia Civil do Ceará
Petrônio Jerônimo dos Santos,
inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
Rafael de Oliveira Domingues,
inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
Raimundo Nonato Nogueira
Júnior, inspetor, Departamento de Gestão de Pessoas
Thiago Morais da Silva, em
liberdade endereço não confirmado *(não é policial)
Walkley Augusto Cosmo dos
Reis, inspetor, Delegacia de Roubos e Furtos (DRF)
Weverton Moreira de Brito,
recolhido na Casa de Albergado de Fortaleza *(não é policial)
Fonte: Diário do Nordeste
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