A troca de comando recente no PTB do Ceará é
mais um exemplo de que o personalismo e suas conveniências imperam sobre uma
agenda programática coerente
O cabo de guerra em torno de mais
um partido
político no Ceará escancara, mais uma vez, a fragilidade
das agremiações partidárias na nossa democracia. É como um lembrete que vai e
vem sempre que fica evidente que, ao servirem mais aos “donos” do que à
sociedade, apequenam-se as instituições e, por isso, o propósito que têm de existir .
O embate da vez é pela presidência do PTB no Ceará . Numa
troca de comando de cunho personalista, a legenda foi de um extremo a outro: da
base aliada do governador Camilo Santana (PT) à
oposição bolsonarista ao chefe do Executivo
Estadual.
A guinada é explicada, sobretudo, por quem comanda o partido atualmente
em âmbito nacional. Por conveniência da onda na qual surfa Roberto
Jefferson , o deputado federal Pedro Bezerra foi
destituído da presidência estadual do PTB para dar lugar ao advogado Fellipe
Cavalcante, filho do deputado estadual Delegado Cavalcante (PSL) .
Na prática, a
legenda foi entregue ao pai, que ainda tenta na Justiça deixar o ex-partido do
presidente Jair Bolsonaro. Decisão individual.
A justificativa trazida a público também busca sustentação nas
palavras-chave dos seguidores da retórica política do ocupante do Palácio do
Planalto: “hoje a cartilha é conservadora. Agora é Deus, Pátria, família e
liberdade”, resumiu Roberto Jefferson sobre o estatuto partidário
vigente.
DESCRÉDITO ESTAMPADO
JÁ NO NOME
É preciso reconhecer que siglas partidárias, como estruturas
orgânicas, passam, sim, por mudanças ao longo do tempo, mas alguém sabe onde
foram parar algumas das bandeiras nacionalistas do Partido
Trabalhista Brasileiro ? O descrédito dado aos nomes de várias
legendas é sintomático de problemáticas muito maiores.
Trago o caso a esta reflexão por ser o mais recente pelas bandas
de cá, mas não foi o primeiro, tampouco será o último. A fórmula que sustenta
uma legenda de aluguel, algo que muitos dirigentes tomam como um xingamento, é
com frequência a mesma, inclusive em outros grupos políticos.
Antes de passar para as mãos dos
Cavalcante, era outra família, embora em outro lado do espectro político local,
que ditava os rumos do PTB no Ceará. Arnon Bezerra , ex-prefeito
de Juazeiro do Norte, presidia a sigla antes de entregá-la ao filho, ao ser
“punido” pelo diretório nacional por escolhas - suas e do herdeiro político -
que contrariaram quem se reivindica “dono”.
A influência do patriarca ,
contudo, se mantinha intacta por aqui, mesmo fora do posto formal de
dirigente.
Tudo isso acontece porque, com o
funcionamento partidário sustentado por comissões provisórias - ou seja, por
comandos indicados pelas instâncias superiores das legendas e não por escolha
dos próprios filiados em processos internos, o que constituiria diretórios
eleitos -, impera a vontade do “rei”. Desagradou, está fora. Há também aqueles
que perdem espaço não por desagrado, mas por outros interesses de ordem
igualmente pragmática.
MOEDA DE TROCA
Após a aprovação da cláusula de desempenho ,
em 2017, ser deputado federal virou praticamente critério de seleção para
comandar partidos em muitos estados, inclusive no Ceará. O cargo tornou-se mais
importante do que a liderança que determinados nomes poderiam ter sobre as suas
legendas.
Por isso, não de hoje, há partidos que representam tão pouco.
Tratados como mera formalidade nos processos eleitorais ,
muitos passam a não ser mais do que isso. Para além das eleições, são usados
também como moeda de troca.
É o que faz o “Centrão” , grupo de
siglas no qual está o PTB, fiel da balança para garantir governabilidade e,
portanto, perpetuador do fisiologismo na política brasileira. Quem ganha? Os
“donos”. As perdas, estas sim, são compartilhadas.
Fonte: Diário do Nordeste.
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