Texto é encaminhado após MP que prevê a venda da Eletrobras, em sinal de apoio à agenda liberal de Guedes
Jussara
Soares e Geralda Doca- O Globo
O presidente
Jair Bolsonaro entregou ao Congresso, no início da noite desta quarta-feira, um
projeto de lei para privatizar os Correios, conforme antecipou
O GLOBO. Pelo segundo dia consecutivo, o presidente foi ao Parlamento
pessoalmente.
O movimento repete a edição de uma medida provisória (MP) para privatizar a Eletrobras, ontem,
quando Bolsonaro também foi ao Congresso num gesto que foi visto mais como uma
tentativa de mostrar aderência à agenda liberal o ministro da Economia, Paulo
Guedes, após a crise gerada por sua interferência na Petrobras.
A
medida ocorre na esteira da movimentação do Palácio do Planalto para sinalizar
apoio à agenda de privatizações defendida por Paulo Guedes.
O
caráter liberal do governo perdeu mais credibilidade após a decisão do
presidente Jair Bolsonaro de trocar o comando
da Petrobras, considerada por agentes do mercado uma intervenção na
petroleira.
Num
evento no Palácio do Planalto, pouco antes de ir ao Congresso, Bolsonaro negou
que a entrega das privatizações de Eletrobras e Correios tenham relação com a
crise na Petrobras, e disse o mesmo sobre a autonomia do Banco Central (BC),
que sancionou naquela cerimônia.
— E minha querida imprensa, isso (autonomia do BC) não é uma resposta ao
caso Petrobras. Não. Até porque isso já vinha sendo trabalhado há muito, bem
como o projeto sobre os Correios, bem como a MP de ontem sobre o sistema
elétrico. Nós, então, (estamos) abrindo, se integrando, democratizando não
apenas no discurso, mas com atos, é que nós mostramos que o Brasil pode mudar.
Ainda sem
modelo para vender Correios
Como mostrou o GLOBO em outubro, o governo finalizou um texto para
destravar a privatização dos Correios no ano passado, mas a proposta
não chegou a ser encaminhada ao Legislativo. O governo não descarta até
mesmo a liquidação da estatal, mas ainda faltam estudos objetivos.
O
texto não apresenta um modelo claro de privatização, mas abre possibilidades. O
próprio governo acredita que o projeto só deva ser votado no fim do ano. Por
isso, a privatização deve ficar para 2022.
A
venda da estatal depende da regulamentação de um trecho da Constituição. Com
exceção de subsidiárias, a desestatização de empresas públicas precisa de
autorização dos parlamentares para avançar.
Funcionários questionam projeto sem
estudo
Em comunicado, a Associação dos
Profissionais dos Correios (Adcap), que se opõe à privatização, reagiu dizendo
que "causa estranheza o governo apresentar ao Congresso Nacional um
projeto antes mesmo de se ter a conclusão dos estudos em curso no BNDES, que,
conforme noticiado antes, poderiam apontar até mesmo que os Corrreios deveriam
permanecer como estão".
A entidade também afirma que é
"motivo de preocupação" o fato de a sociedade não ter tido
oportunidade de discutir previamente o tema, dada a falta de estudos sobre os
resultados que poderiam ser colhidos.
A Adcap afirma ainda que há poucos
serviços postais privatizados no mundo, o que seria um sinal de que a medida
não seria positiva em relação ao custo para a população, por exemplo.
"A Adcap espera que deputados
e senadores saibam avaliar com o cuidado e a cautela necessários esse projeto,
que lhes chega dessa forma atribulada, sem base técnica consolidada e sem o
necessário amadurecimento junto à sociedade", diz o texto.
Fim do monopólio de serviço postal
O projeto de venda da estatal
permite que os serviços postais, inclusive os prestados em regime de monopólio
possam ser explorados pela iniciativa privada.
A proposta disciplina o Sistema
Nacional de Serviços Postais (SNSP), correspondências e objetos postais e
emissão e fabricação de selos e o Serviço Postal Universal, cuja garantia de
prestação é obrigatória da União, em todo o território nacional, de modo
contínuo e a preços competitivos.
Outra novidade é a transformação
dos Correios em sociedade de economia mista.
Segundo fontes a par das discussões,
o projeto não significa, por si só, a extinção dos Correios. O objetivo é
estimular a concorrência no setor, criando condições para a entrada do setor
privado, em regime de concessão, cadastro ou parceria.
O modelo final a ser adotado para o
setor ainda depende de estudos econômicos e setoriais.
O projeto também aumenta as
competências da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que passará a se
chamar Agência Nacional de Telecomunicações e Serviços Postais.
Concorrência no radar
Entre os motivos alegados pelo
governo para privatizar os Correios é a necessidade de ampliar os investimentos
para enfrentar a concorrência no segmento de encomendas. A estatal investe
apenas 2,8% da receita operacional, enquanto que FedEx e SingPost, a proporção
fica entre 13% e 14%.
Outra questão diz respeito à
situação financeira delicada da estatal, diante do peso elevado das despesas
com pessoal. Esse gasto representa 64% dos seus custos totais da empresa, são
quase 100 mil funcionários, “tornando-a uma das empresas postais com maior
custo relativo de pessoal do mundo”, diz a nota técnica.
Além disso, a estatal apresenta
ineficiências operacionais, a relação custo total e receitas supera 90%.
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