A reestruturação de empresários brasileiros e o avanço do instituto da mediação.

 



Foto:  Advogada Nathália Albuquerque Lacorte Borelli

Por Nathália Albuquerque Lacorte Borelli*


O uso da mediação empresarial tem crescido muito nos últimos anos. Segundo a pesquisa “Mediação em Números”, conduzida pela FGV Direito SP, o número de requerimentos de mediação saltou de 26 em 2012 para 120 em 2021.

 

A reforma introduzida pela Lei nº 14.112/2020 trouxe avanços para o sistema recuperacional brasileiro, ao incorporar expressamente a mediação como instrumento hábil no âmbito da Lei de Recuperação e Falências. A mediação passou a ser admitida tanto de forma prévia ao ajuizamento do pedido de recuperação judicial quanto de forma incidental em processos já em andamento.

 

Essa medida busca promover soluções consensuais em conflitos envolvendo sócios ou acionistas de empresas em crise econômico-financeira, bem como litígios com credores não sujeitos aos efeitos da recuperação judicial ou com credores extraconcursais. O art. 20-B, inciso I, da Lei de Recuperação e Falências consagrou expressamente a possibilidade de instauração de mediação incidental para resolver controvérsias entre a empresa recuperanda e credores alheios ao processo recuperacional, ampliando as alternativas de superação de crises.

 

Esse instrumento favorece a continuidade das atividades empresariais, permitindo a construção de soluções negociadas que não dependem, necessariamente, da rigidez do processo judicial. Um exemplo recorrente da importância da mediação incidental ocorre quando a empresa já está em processo de recuperação judicial e possui garantias fiduciárias sobre os bens essenciais ao funcionamento da empresa, especialmente imóveis onde são desenvolvidas as atividades empresariais.

 

É comum que tais bens estejam vinculados a contratos firmados com instituições financeiras, cuja inadimplência, por conta da redução de fluxo de caixa, impede o cumprimento das obrigações. Por força do art. 49, §3º, da Lei de Recuperação e Falências, os créditos garantidos por alienação fiduciária não se submetem aos efeitos da recuperação judicial. Assim, encerrado o stay period (prazo de 180 dias em que as execuções são suspensas), é frequente que os credores iniciem medidas para consolidação da propriedade e leilão dos ativos, comprometendo diretamente a continuidade da atividade empresarial.

 

Nesses casos, como a situação trata de crédito extraconcursal, a mediação incidental se revela uma alternativa eficaz e estratégica, permitindo que a empresa negocie com os credores fiduciários, com o objetivo de buscar soluções viáveis à manutenção da posse do bem e da atividade econômica.

 

Na hipótese de mediação antecedente, as empresas que preencham os requisitos previstos em lei para a recuperação judicial podem requerer ao juízo competente a concessão de tutela cautelar de urgência, medida judicial usada para proteger bens ou direitos enquanto se busca uma solução definitiva, com o objetivo de suspender, por até 60 dias, as ações de execução em curso. Isso estimula diligências voltadas à adoção de métodos autocompositivos com os credores, amadurecimento de propostas e a preservação de ativos essenciais à operação da empresa.

 

A legislação ainda dispõe que os acordos celebrados em sede de conciliação ou mediação deverão ser submetidos à homologação judicial, conferindo-lhes plena eficácia jurídica. Além disso, autoriza que as sessões de mediação sejam realizadas virtualmente, desde que o CEJUSC ou a câmara especializada disponha de infraestrutura tecnológica para tanto, promovendo maior celeridade, acessibilidade e redução de custos às partes envolvidas.

 

Muitas empresas encerram suas atividades sem recorrer a mecanismos formais de renegociação com credores, o que poderia viabilizar sua continuidade. Conforme dados do Mapa de Empresas, do Governo Federal, 854.150 empresas foram fechadas no primeiro quadrimestre de 2024, representando um aumento de 24,4% em relação ao último quadrimestre de 2023.

 

A mediação representa um avanço no tratamento da crise empresarial, por introduzir uma via mais célere, colaborativa e menos onerosa para superar a insolvência. Ao estimular o diálogo e a construção de soluções consensuais, a mediação contribui significativamente para a preservação da atividade empresarial, da geração de empregos e da função social da empresa.

 

*Nathália Albuquerque Lacorte Borelli é advogada formada pela PUC-Campinas, com pós-graduação em Gestão e Estratégia Empresarial pela Unicamp e em Direito Tributário pela PUC-RS. É membro das Comissões de Falências e Recuperação Judicial e de Direito Bancário da OAB Campinas, além de atuar no CMR e na IWIRC – Brasil.

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