Foto:Divulgação
A pandemia mudou comportamentos e acelerou a digitalização
dos negócios em diversos setores. Agora, o Brasil se prepara para dar um salto
ainda mais importante em inovação: a adoção da tecnologia 5G, usando uma
frequência dedicada, o que será possível a partir do leilão de espectro
previsto para o início do próximo ano. O presidente da Ericsson para o Brasil e
o Cone Sul da América Latina, Eduardo Ricotta, acredita que o país está diante
de decisões que devem interferir não apenas na retomada da economia no curto
prazo, mas, sobretudo, no grau de desenvolvimento que pode ser alcançado.
Segundo ele, é preciso promover as
condições para que o Brasil se torne cada vez mais um criador de novos produtos
e serviços digitais, em vez de apenas importar soluções desenvolvidas nos
países ricos. “Só assim é possível gerar volumes realmente grandes de riqueza”,
ele afirma. “Não é à toa que hoje o aplicativo de videoconferências Zoom vale
mais do que a Petrobras.”
Nesta entrevista, Ricotta fala sobre as
transformações que ocorreram durante a pandemia, as perspectivas para a chegada do 5G e a participação da
Ericsson no desenvolvimento dessa tecnologia no Brasil e no mundo.
Qual foi o impacto da pandemia
no setor de telecomunicações?
Ricotta: A pandemia
colocou esse segmento em uma posição de evidência jamais vista. Uma pesquisa que fizemos mostrou que os serviços de
telecomunicação subiram do décimo para o terceiro lugar entre as prioridades
das famílias. Foi graças a eles que as pessoas conseguiram estudar, trabalhar,
fazer compras, consultas médicas à distância. Diversos dados reforçam isso. O
tráfego de dados cresceu 30% nesse período. Os pagamentos por celular aumentaram
32%. O tempo que as pessoas passam diante da tela do celular subiu entre 30 e
50%.
O quanto essa mudança acelerou
a digitalização da economia?
Ricotta: Vimos uma aceleração
muito grande na digitalização de alguns setores. O principal foi a educação, que,
de uma hora para a outra, colocou milhões de pessoas para fazer aula
remotamente. De acordo com a Khan
Academy, a digitalização desse segmento avançou cerca de dez anos
em 2020. No varejo, essa aceleração foi de um a três anos; no segmento de saúde
e trabalho remoto, de três a cinco anos. Dois setores foram muito resilientes
durante a pandemia, o de home
entertainment, de serviços como Netflix e Amazon Prime, que demanda
muita banda larga móvel e fixa, e o de alimentação. A pandemia pegou todo mundo
meio de calça curta, mas, ao mesmo tempo que algumas empresas sofreram bastante
durante a pandemia, outras se saíram muito bem. O Mercado Livre, por exemplo,
vendeu em três meses o previsto para três anos. A C&A aumentou o e-commerce
em 250%; a Natura, em 248%; a Sul América passou de 500 para 80 mil consultas
online por mês. Obviamente, a recuperação de empresas que estão mais
digitalizadas vai ocorrer bem mais rápido. No próximo ano, o Brasil deve
realizar o leilão de frequências para o 5G.
O que isso significa para o país?
Ricotta: O 5G está relacionado
diretamente com inovação. Se analisarmos o Global
Innovation Index de 2020, perceberemos que os dez países mais
bem posicionados no ranking de inovação são também os dez maiores em adoção da
tecnologia 5G: Suíça, Suécia, Estados Unidos, Reino Unido, Holanda, Dinamarca,
Finlândia, Cingapura, Alemanha e Coreia do Sul. [O Brasil aparece na 62ª
colocação.] Isso não é coincidência. Assim como o 4G foi disruptivo, permitindo
o surgimento de serviços como Uber e o iFood, o 5G dá origem a uma nova
revolução. Além de proporcionar velocidades extremamente altas, ele oferece um
tempo de resposta, que nós chamamos de latência, muito pequeno, próximo de
zero. Isso permite prover serviços que exigem respostas praticamente instantâneas.
Poderia dar alguns exemplos de
mudanças esperadas?
Ricotta: O 5G está pronto para
transformar as indústrias e a sociedade, atendendo às mais diversas demandas,
de smartphones a robôs em fábricas, que exijam conectividade de alto desempenho
e alta confiabilidade. Imagine bilhões de dispositivos conectados coletando e
compartilhando informações em tempo real para reduzir acidentes rodoviários. Ou
aplicativos que salvam vidas, que podem voar graças a conexões garantidas sem
atrasos. Ou linhas de produção tão preditivas que podem evitar interrupções bem
antes que ocorram. Na agricultura, setor que hoje está atrasado em termos de
digitalização, o 5G torna possível avanços expressivos, tais como ter uma
colheitadeira autônoma, sem operador, fazendo a colheita e enviando informações
instantâneas para a base de controle. Na medicina, o médico poderá fazer um
exame ou uma cirurgia a distância com muito mais precisão. Na educação, que
ainda carece de bons conteúdos digitais, a holografia em 3D permitirá ensinar
como funciona o corpo humano. A área de entretenimento passará por uma
revolução por meio da realidade virtual e aumentada. Vai ser possível assistir
a um jogo de futebol de casa como se estivesse dentro do campo.
Como a Ericsson está posicionada hoje no mundo
em relação ao 5G e quais os planos para o Brasil?
Ricotta: A Ericsson foi
pioneira na implementação de 5G em cinco continentes. Hoje, temos mais de 60
redes comerciais ativas em mais de 30 países – incluindo EUA, Reino Unido,
Suíça, Austrália, Oriente Médio, China, Itália, Alemanha e Brasil –, e mais de
100 contratos assinados para implantação da tecnologia. Somos o principal
impulsionador da padronização global da indústria do 5G, como maior percentual
de patentes essenciais dessa tecnologia. No Brasil, onde estamos há 95 anos,
somos líderes no provimento de tecnologias móveis e temos trabalhado de forma
dedicada junto a nossos clientes para apoiá-los na evolução do 4G ao 5G. Em
julho, lançamos aqui a primeira rede 5G DSS do país e da América Latina, em
parceria com a Claro, Qualcomm e Motorola. A solução DSS, que foi desenvolvida
e patenteada pela Ericsson, permite às operadoras iniciar rapidamente a oferta
de serviços 5G, reutilizando a infraestrutura de rede já existente no 4G e
aproveitando os investimentos feitos anteriormente em espectro e
infraestrutura. A partir do leilão da frequência 3,5 GHz planejado para 2021,
será possível implementar o 5G em sua totalidade.
A pandemia afetou os planos de investimento da
Ericsson para o Brasil?
Ricotta: Mantemos nosso
foco para inovar, provar a qualidade e a capacidade de cobertura. Sabemos que o
“novo normal” demandará novos serviços e provocará uma nova experiência ao
consumidor com o 4G e 5G, e precisamos apoiar nossos clientes nessa jornada.
Estamos prontos para isso. No ano passado, a Ericsson anunciou investimento de
R$ 1 bilhão no Brasil nos próximos cinco anos para P&D dessa tecnologia e
também para produzir equipamentos para 5G em nossa fábrica em São José dos
Campos, que fornece não apenas para o mercado brasileiro, mas exporta 40% da
produção para países da América Latina.
“País precisa criar um Plano de Estado para o
5G”
Presidente
da Ericsson aponta cinco questões fundamentais que precisam ser endereçadas
O presidente da Ericsson para o Brasil e o Cone Sul,
Eduardo Ricotta, defende que o País adote um Plano de Estado para o 5G com foco
em cinco pontos fundamentais. O primeiro diz respeito ao incentivo à inovação.
“Precisamos assegurar que o Brasil participe da criação de novos serviços e
aplicações, porque é assim que a gente gera riqueza no País”, ele justifica.
“Não é à toa que hoje o aplicativo de videoconferências Zoom vale mais do que a
Petrobras.” O caminho nessa direção envolve, segundo ele, mais investimentos em
educação, pesquisa e desenvolvimento e parcerias do setor público e o privado.
O segundo ponto é reduzir o custo para garantir espectro
suficiente para lançar serviços de 5G com qualidade. “O Brasil tem o espectro
mais caro do mundo, quando se leva em consideração a renda per capita da
população”, afirma. Para isso, segundo ele, é fundamental focar o leilão da
frequência 5G em infraestrutura, em vez de adotar viés arrecadatório.
Rever a tributação do setor de telecomunicações constitui o
terceiro ponto. “Um serviço tão essencial não pode ter o mesmo imposto que
itens como joias, tabaco e bebidas”, compara Ricotta. “Temos que endereçar esse
problema nas discussões que estão ocorrendo em torno da reforma tributária.”
O quarto ponto diz respeito à proteção
de dados, que se torna ainda mais importante no caso de uma tecnologia que
estimula o armazenamento de informações em nuvem e aumenta a suscetibilidade a
ciberataques. “É preciso criar uma regulamentação muito robusta para garantir
muita segurança nessas redes e infraestruturas digitais”, afirma.
Por fim, Ricotta defende medidas para
acelerar a digitalização de setores que se encontram mais atrasados nesse
sentido. “Existe um gap digital muito grande, por exemplo, no agronegócio, que
representa 25% do PIB do Brasil”, diz. “O País precisa adotar medidas para
encurtar essa distância.”
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