O QUANTO CUSTA!


 

 Por: Wyldevânio Vieira.

Era natal de 1992, os raios que atravessavam a vidraça do quarto anunciavam a chegada de um novo dia. O sol despontava no horizonte da Grande Vitória, capital do Estado do Espírito Santo, para onde fugidos da dura realidade econômica e social do Nordeste, fomos eu e minha família.


Tempos difíceis eram aqueles, pois felizes os que emprego tinham e com muito sacrifício sua família podiam manter. Não diferente dos demais, nossa vida, apesar de muito feliz, não era fácil. Em meio a uma grande crise econômica e um turbilhão político vivíamos, ainda assim, a palavra esperança regia nossas vidas.

Para mim, uma criança de apenas cinco anos de idade, tudo era maravilhoso e encantado naquele meu pequeno mundo. Eu e minha irmã ainda depositávamos o dente debaixo do travesseiro, esperávamos o coelhinho da páscoa, tínhamos medo de bruxas e o mais importante, acreditávamos em Papai Noel. Naquela manhã de 25 de dezembro de 1992, acordei-me eufórico e muito curioso para saber qual presente o bom velhinho teria me deixado. Era um “carrinho a fricção”. Rodinha emborrachadas, pintura metálica, portas que abriam e tão veloz quanto a minha imaginação. Porém, como um curioso que sempre fui, resolvi abri aquele carrinho, pois queria entender como o mesmo funcionava e de onde surgia aquela força que o impulsionava com tanta rapidez. Logo molas e engrenagens se espalharam pelo chão da sala, chamando a atenção de todos que ali estavam. Dentre eles, meu pai, que muito desapontado e um tanto furioso, fitou-me bem os olhos e disse –se você soubesse o quanto custa, não teria feito isso. Aquela foi uma frase que me marcou profundamente, e assim cresci, buscando entender o valor de todas as coisas, até mesmo as menos importantes.

Anos depois e imerso numa profunda reflexão, regressei ao passado e revivendo aquela história, pude entender que com alguns cruzeiros, poderia meu pai ter comprado aquele carrinho, mas nem todo o dinheiro do mundo pagaria a alegria que ele sentiu ao presentear um filho que ama. Com o tempo e com os custos da vida, compreendi então, que apesar de tudo ter um valor, nem tudo se pode comprar. E são essas coisas, que inalcançáveis aos braços monetários, fazem mover as engrenagens da honestidade, da justiça do respeito ao próximo e do amor fraternal. Tão logo, vinte e sete anos se passaram e aquele mesmo sol renasce para anunciar o natal de 2019, agora no torrão cearense onde os egressos da seca comemoram o feliz retorno.

Após tantas lutas e batalhas, puderam então viver onde sempre pretenderam estar. Algumas coisas mudaram, a vida se tornou mais leve, é fato. Porém, carrinhos a fricção já não são os presentes mais cobiçados e as pessoas se tornaram frias, individualistas, egoístas até. Jogos online, simuladores de aventura, realidade virtual, ocupam agora lugar de destaque nos pedidos de nossas crianças e adolescentes. Isso não me preocupa, pois representam apenas a inevitável evolução da humanidade. O que me preocupa de verdade, é se em algum momento da vida dessas crianças alguém conseguiu lhes dizer o quanto custou tudo isso. E assim, fazendo-lhes entender que não tão distante, durante a história recente do nosso país, coisas como o acesso a água potável, energia elétrica, saúde, educação, merenda e transporte escolar, cultura, esporte e lazer, paginavam nossos pedidos natalinos, assim como os clamores das ruas e os anseios gerais da humanidade. Hoje o meu pedido, não vai ao Papai Noel, mas a Deus em quem continuo crendo. A ele peço que nossos jovens possam entender o quanto custou a liberdade, o direito de ir e vir, de votar e ser votado, o acesso ao ensino superior e ao emprego de qualidade.
Rogo a Deus que os façam entender o quanto custa uma mesa farta, lazer no final de semana, cinema, shows, internet, puder falar o que pensam e tudo mais quanto tenham a sua disposição. Essas e tantas outras coisas pelas quais lutei e lutaram aqueles que me antecederam na jornada da vida. Que neste natal a nossa juventude possa refletir sobre a lição divina de poder crescer sem romper os valores humanos, de frutificar sem perder suas raízes, de poder voar sem esquecer o chão de onde veio.

Que aquele sol continue a nascer a cada dia e junto dele renasça a esperança, a fé em dias melhores e, sobretudo, o amor entre os povos e o respeito entre as gerações. Que no ano que se avizinha possamos encontrar forças, não somente para a realização de tantos desejos, mas também, para a manutenção de todos os sonhos já realizados. Por uma juventude que entenda seu valor e assim possa calcular com segurança a projeção do seu próprio futuro.

Wyldevânio Vieira da Silva

Filho de Antônio Ildo Vieira e Luiza Pereira Vieira nasceu em Crato onde reside atualmente, tem 32 anos de idade e é Técnico em Agropecuária, formado pelo Instituto Federal do Ceará – Campus Crato e Biólogo, formado pela 
Universidade Regional do Cariri – URCA.

Como profissional sempre atuou na área de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Atualmente é Coordenador Regional de Assistência Técnica e Extensão Rural do Instituto Agropolos do Ceará e atua como Consultor Ambiental.

Está como Presidente do Comitê da Sub Bacia Hidrográfica do Rio Salgado e em suas horas vagas gosta de escrever, especialmente sobre suas observações da natureza e do comportamento humano.

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