Sob
o telhado de amianto da Metalúrgica Santa Luzia, na avenida Presidente Castelo
Branco (bairro Cristo Redentor), repousa uma estrutura de aço policromado
formada por discos circulares. É Pulsação, escultura projetada por Sérvulo
Esmeraldo em 1980, que, ao lado de três outras obras, voltará a integrar a
paisagem urbana de Fortaleza. O artista notável, que morreu em fevereiro desse
ano, sonhava em transformar a Cidade em um “museu a céu aberto”. E o desejo — a
depender de sua esposa e guardiã — Dodora Guimarães, se tornará realidade.
Graças
a iniciativa do Instituto Sérvulo Esmeraldo, estão sendo recuperadas também, a
escultura em aço Infinito, de 1983, que está instalada na Praça General Murilo
Borges; a escultura-fonte Ballet Gráfico, de 2002, instalada na Praça da Sé e
que receberá paisagismo, iluminação e placa indicativa; e a escultura cinética
La FemmeBateau, o “barquinho”, datado de 1994, já recuperada e devolvida à
Ponte dos Ingleses.
Dodora
narra que Sérvulo deixou dezenas de instruções, em pastas avulsas e cadernos,
explicando como deveriam ocorrer as restaurações. Há, também, projetos de novas
obras ainda intocados. “Ele tinha chegado a um ponto particularizado na
história da arte cinética, ele inventou um tipo de arte que só ele fez e chamou
de excitáveis. Mas Sérvulo estava no Exterior e abriu mão dessa pesquisa para
viver em Fortaleza. É nesse momento que ele troca os excitáveis pela arte
pública. Ele negociou isso”, explica Dodora, falando sobre a volta de Sérvulo
ao Ceará, no fim da década de 1970. Na Europa e nos Estados Unidos, ele é
artista aplaudido e é considerado dono de uma obra inigualável e sem
precedentes.
Para
o trabalho de recuperação das obras, a guardiã da memória de Sérvulo buscou o
homem que ganhou a confiança do artista nas últimas décadas: Ari Josino.
Comandante da Metalúrgica Santa Luzia, ele é responsável pelas esculturas de
Sérvulo Esmeraldo, de maior ou menor porte, desde o início dos anos 2000. “Para
a realização dessas obras, é necessário que o construtor entre na sintonia. E
também seja movido a algo que pertence ao reino dos artistas: a paixão”,
reflete Dodora.
É
na metalúrgica-ateliê — cheia de caixas, tintas, luzes e metais — onde são
seguidas as instruções deixadas por Sérvulo e criadas soluções para problemas
de operação que surgem no processo criativo. “É um envolvimento na alma do
artista”, explica Ari, que já fez restauração da obra La FemmeBateau
anteriormente. Sérvulo, explica Dodora, além de anotações minuciosas em cadernos,
construía maquetes das obras. A peça que representa Pulsação, repousada sobre a
mesa de Ari, servirá como guia para as cores de cada disco. A obra ainda não
tem local de instalação definido.
Quarenta
obras públicas ou integradas a arquitetura foram erguidas por Sérvulo Esmeraldo
em Fortaleza. O desejo de Dodora é revitalizar cada uma, criando, inclusive,
mecanismos para manutenção e conservação das peças, além de sinalizar a autoria
do artista - muitas vezes desconhecida do público. “Quando digo que a
restauração dessas quatro obras é um começo, é porque pretendo restaurar e
conservar toda a obra dele. E até avançar. Ele deixou muitos projetos. E eu
quero ter forças para conseguir realiza-los”, finaliza Dodora Guimarães.