Chage - Wagner Francesco
Por: Leopoldo Martins Filho
A
imunidade parlamentar é uma das garantias constitucionais conferidas aos
membros do Poder Legislativo, seja na esfera federal, estadual ou municipal. No
caso dos vereadores, essa proteção encontra-se prevista no artigo 29, inciso
VIII, da Constituição Federal, que assegura a inviolabilidade por suas
opiniões, palavras e votos proferidos no exercício do mandato e na
circunscrição do município. Todavia, como todo instituto jurídico, essa
prerrogativa possui limites — e não se presta a acobertar abusos, agressões
morais ou ataques pessoais travestidos de liberdade de expressão parlamentar.
O
plenário da Câmara Municipal deve ser espaço de debate, proposição e
fiscalização, jamais arena de humilhação e desrespeito. É papel do Legislativo,
do Judiciário e da própria sociedade civil colocar freios nos excessos e
reafirmar que a dignidade humana está acima da retórica maliciosa.. Quando
essas manifestações transbordam o campo político e ingressam no terreno do
achincalhamento moral, atingindo a honra objetiva e subjetiva de seus alvos,
tornam-se manifestamente desconectadas do exercício legítimo da vereança.
Da
Imunidade à Impunidade: Um Abismo Inaceitável
A
imunidade parlamentar existe para proteger o livre exercício do mandato,
garantindo que o parlamentar possa se posicionar politicamente sem o temor de
retaliações judiciais indevidas. No entanto, é temerário — e inaceitável —
permitir que tal imunidade seja manipulada como um escudo para ofensas
pessoais, especialmente aquelas proferidas por mero prazer da maledicência,
ressentimento ou ódio pessoal.
As
palavras agressivas e a violência política de gênero, quando direcionadas a um
colega de parlamento ou a qualquer cidadão, não se confundem com o exercício da
atividade legislativa. Muito pelo contrário, revelam a degradação do ambiente
parlamentar e a instrumentalização da tribuna como palco de agressões verbais,
absolutamente alheias ao interesse público e ao exercício democrático da
vereança.
Violência
Política de Gênero e a Desvirtuação da Função Parlamentar
A
situação se agrava ainda mais quando tais ataques assumem contornos de
violência política de gênero, o que configura não apenas abuso da imunidade
parlamentar, mas também grave afronta aos direitos humanos e à dignidade da
pessoa humana, fundamentos basilares da Constituição. A vereança, enquanto
representação popular, exige comportamento compatível com a ética, o respeito e
a urbanidade — valores estes que são dilacerados quando a imunidade é utilizada
para perpetuar práticas misóginas e discriminatórias.
Entre
o Mandato e o Delito: A Fronteira da Responsabilidade
É
forçoso reconhecer que a imunidade parlamentar não é e nunca foi um
salvo-conduto para a impunidade. Não se trata de um cheque em branco para que
parlamentares possam injuriar, caluniar ou difamar com respaldo da lei. Ao
contrário, sua função é garantir a independência do legislador frente aos
interesses do poder econômico e político, não legitimando o uso da tribuna para
a promoção de ofensas gratuitas.
A
imunidade não pode servir de abrigo para condutas que se divorciam por completo
das atribuições inerentes ao mandato.
Conclusão
A
proteção conferida pela imunidade parlamentar deve ser compreendida como
instrumento de fortalecimento da democracia, e não como passaporte para o
abuso. Quando um vereador ultrapassa os limites do discurso político e envereda
pelo caminho da agressão pessoal, especialmente motivada por sentimentos
menores ou por discriminação de gênero, perde qualquer conexão com a função
pública que exerce.
A
inviolabilidade prevista no artigo 29, VIII, da Constituição não foi criada
para blindar vilipêndios à honra alheia, mas para proteger o legítimo exercício
da função legislativa. Portanto, cabe ao Poder Judiciário, à sociedade e às
próprias Câmaras Municipais fazer valer o espírito da lei, repelindo os desvios
e responsabilizando exemplarmente os que desonram a nobre função da vereança.
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