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| Foto: Reprodução |
Pesquisadores da Embrapa
Cerrados (DF) desenvolveram uma nova cultivar de capim, o capim-andropogon, a
BRS Sarandi. Trata-se de uma evolução do Andropogon gayanus cultivar
Planaltina, a primeira forrageira tropical lançada comercialmente pela Embrapa
em 1980. Além do ótimo desempenho para os rebanhos do Cerrado brasileiro, com
ganhos que chegam a 1,15 kg de peso vivo por dia para bovinos em recria,
durante a estação chuvosa, a nova variedade garante alta produtividade em solos
de baixa fertilidade e maior valor nutricional.
“A nova cultivar da Embrapa é
excelente opção para os ambientes mais desafiadores em relação ao clima e ao
solo, como os que têm solos com baixa fertilidade ou passam por longos períodos
de seca ou ainda os que sofrem com ataques severos de cigarrinhas. Esse capim
se destaca por sua rápida rebrota, elevada qualidade nutricional e seu ótimo
consumo pelos animais”, explica o pesquisador Marcelo Ayres, da
Embrapa Cerrados.
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A cultivar é recomendada para áreas com menor fertilidade natural do Cerrado,
inclusive no Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), e também para áreas
marginais das fazendas onde a agricultura e outras espécies forrageiras não se
desenvolvem bem.
Nos
experimentos conduzidos na Embrapa Cerrados, a BRS Sarandi apresentou
resultados de desempenho animal muito satisfatórios para o rebanho, como
explica o pesquisador Gustavo Braga: “Avaliamos os ganhos de peso de
animais bovinos da raça Nelore. Os animais mantidos no pasto de BRS Sarandi
ganharam de 8% a 10% de peso quando comparados aos animais mantidos na cultivar
Planaltina”. O pesquisador explica que essa diferença ocorre basicamente porque
a cultivar Sarandi apresenta maior quantidade de folhas em relação à
Planaltina. Consequentemente, ela tem melhor valor nutritivo e isso se reflete
no desempenho dos animais em pastejo.
Os
diferenciais da cultivar
No bioma Cerrado, a cultivar é a primeira a rebrotar logo após as primeiras
chuvas. Ela garante alimento para o gado no início da estação chuvosa, quando
as outras forrageiras ainda não começaram a produzir. Essa vantagem foi
comprovada pelo empresário Celso Pess Júnior, responsável pela Sementes
Ponto Alto, uma das empresas que está multiplicando as sementes do Andropogon,
com propriedade em Ribas do Rio Pardo (MS).
“Nós
colocamos a BRS Sarandi em uma área de baixa produtividade, degradada. E
também, propositadamente, em uma área de fertilidade bem baixa. Mesmo assim,
ela se destaca muito. Suas plantas passam as outras em altura e formam um bom
volume de massa. Ela tem uma rebrota e um crescimento muito rápido,
principalmente no início da estação chuvosa”, salienta ele.
Pess
ressalta ainda a composição da forragem e sua aceitação pelos animais: “O
volume da BRS Sarandi está muito relacionado ao volume de folhas que ela tem. A
planta praticamente não tem talo, tudo o que ela produz é folha. É um material
bem aveludado, bem macio. Os animais gostam muito. Nós vimos uma pressão de
pastoreio muito grande em cima dela, na área onde tem outros pastos
misturados”.
Fábio
de Oliveira Júnior, responsável pela Agrosol, empresa de sementes situada
em Goiânia (GO), ficou interessado na cultivar justamente quando soube que ela
tem mais folhas do que as outras cultivares. Ele plantou uma área com a BRS
Sarandi e colheu 40 toneladas. As sementes produzidas para a
comercialização na safra 2023/24 foram praticamente todas vendidas. “O mercado
é carente de novas variedades, principalmente de Andropogon, que só tem duas”,
justifica.
O
empresário conta como foi essa primeira experiência com a cultivar: “Deu muito
certo esse primeiro plantio. Foi até uma surpresa porque a produtividade foi
muito boa. Colhemos em agosto e a produção foi quase toda vendida para
pecuaristas de Goiás, Minas Gerais e Tocantins”.
Ele
ressalta que o preço da semente ainda está alto porque tem pouca oferta no
mercado. Mas acredita que em breve esse cenário mudará: “Na próxima safra,
teremos uma produção maior. Com certeza, os preços estarão melhores para o
pecuarista”.
Outros
aspectos de destaque da cultivar são: maior qualidade da forragem, maior
perfilhamento e plantas mais uniformes. “A resistência a pragas e doenças é um
dos pontos fortes dessa espécie. Com ela, o pecuarista não precisa se preocupar
com pragas como cigarrinhas e nematoides. Além disso, a espécie tolera bem a
incidência de fogo”, salienta o pesquisador Marcelo Ayres.
Para
orientar a recomendação da cultivar, a Embrapa Cerrados está preparando um
material para os técnicos das revendas agropecuárias, com as principais
características e orientações. “O objetivo é que as equipes de venda tenham à
mão as principais características e orientações para saber indicar a cultivar”,
explica o pesquisador.
Outro
material será elaborado especificamente para o pecuarista, acompanhando as
sementes compradas. Nele, constarão o período de plantio, de adubação,
informações sobre os manejos do pasto e do rebanho, quando colocar e tirar o
animal do pasto, entre outras, para garantir o melhor aproveitamento do
material.
Resultados
além do esperado
“Os dados de produtividade que registramos foram altíssimos, não esperávamos
esse resultado”, destaca Gustavo Braga. O ganho de peso vivo médio diário de
bovinos Nelore machos em recria foi avaliado em pastagens de BRS Sarandi na
Embrapa Cerrados entre abril de 2018 e junho de 2020. Os bovinos foram mantidos
em três taxas de lotação (1,5, 2,5 e 3,3 unidades animal por hectare (UA/ha)),
em piquetes de 1,5 ha, em lotação contínua. No experimento, a taxa de lotação
intermediária (2,5 UA/ha) teve o melhor resultado: 15 arrobas de carcaça por
hectare/ano.
Quanto
à produtividade de forragem, a cultivar também foi avaliada por dois anos,
durante os períodos das águas e da seca. A produtividade de massa seca e a
forragem acumulada foram similares às das cultivares Planaltina e Baetí – de 11
a 15 toneladas por hectare por ano, com adubação de nitrogênio entre 40 e 60
quilos por hectare por ano. “Esse patamar pode aumentar com maiores doses de
nitrogênio ou em ambientes com estação chuvosa mais prolongada”, informa Braga.
No
entanto, apesar de as produtividades terem sido similares, a BRS Sarandi
produziu maior quantidade de folhas, principalmente nas rebrotações da estação
chuvosa, que é o período com maior acúmulo de forragem e hastes. O pesquisador
ressalta o impacto dessas melhorias no sistema de produção: “As características
da cultivar, como plantas mais uniformes e baixo porte, com mais folhas e menos
hastes, facilitam o manejo do pasto pelo pecuarista e aumentam o consumo da
gramínea pelos animais”.
A
nova cultivar da Embrapa é recomendada para uso em pastagens puras ou
consorciadas com leguminosas na região do Cerrado, em solos de baixa à média
fertilidade, com textura que varia de arenosa à argilosa, sem problemas de
drenagem.
“O
cultivo em consórcio com milho ou sorgo é uma alternativa para amortizar os
custos de implantação do pasto e ainda intensificar o uso da terra”, ressalta o
pesquisador Allan Kardec, também componente da equipe da Embrapa Cerrados.
Em Planaltina (DF), a semeadura simultânea com milho na primeira safra resultou
em 5,2 toneladas por hectare (t/ha) de grãos e 2,1 t de massa seca (MS/ha) de
massa de forragem.
O
uso da BRS Sarandi deve ocorrer preferencialmente em sistemas extensivos de
cria e recria de bovinos, com ênfase no aproveitamento da forragem na estação
chuvosa. Em pastos bem manejados em sistemas mais intensificados, com alta
oferta de forragem e de folhas, também pode proporcionar elevados desempenhos
animais nas fases de engorda e terminação.
A
forrageira é recomendada para ovinos, caprinos e até mesmo equinos. “Sobre a
aceitação da forragem pelos animais, chamamos a atenção de que isso depende de
um bom manejo dos pastos. Se as plantas estiverem muito altas, passadas, o
animal terá dificuldade de consumir essa forragem e, consequentemente, o
desempenho será mais baixo, seja em ganho de peso, seja na produção leiteira”,
reforça Braga. Outra opção é usar a cultivar para produção de feno ou silagem.
O Andropogon
gayanus é uma planta forrageira perene que cresce em touceiras. É uma
espécie pouco exigente em relação à fertilidade do solo e tolera ambientes com
baixa pluviosidade. Por essas características, a BRS Sarandi pode ser cultivada
em ambientes de outros biomas, como a região Norte (bioma Amazônia) e parte da
região Nordeste (bioma Caatinga), onde já é feito o cultivo das outras
cultivares de capim-andropogon, além de regiões com pluviosidade menor ou
instável, como o Semiárido nordestino.
No
entanto, ela não tolera encharcamento. O acúmulo de água no solo afeta o
desenvolvimento das plantas. Portanto, a recomendação é para plantio em solos
bem drenados, o que limita seu cultivo na região amazônica.
O
Andropogon, que você já conhece, agora muito melhor
Na década de 1990 estima-se que a cultivar Planaltina chegou a ocupar 5% do
mercado formal de forrageiras em pastagens do Cerrado e da Amazônia. Hoje, ela
ocupa cerca de 1,5 milhão de hectares, o que corresponde a 2% do mercado. Para
os produtores que já utilizam o capim-andropogon, a BRS Sarandi traz
facilidades e melhores resultados, mas mantém as características já conhecidas.
A
expectativa é que ela substitua a cultivar anterior e ainda seja adotada por
produtores que apostam na diversificação das pastagens. “Nós refinamos alguns
atributos da cultivar Planaltina para chegar à BRS Sarandi. Depois de 40 anos,
retomamos o programa de melhoramento genético da espécie. Focamos em algumas
características e mantivemos as qualidades pelas quais ela já é conhecida,
consolidadas pela história de sucesso das duas cultivares anteriores, a
Planaltina e a Baetí [cultivar da Embrapa lançada em 1993]”, afirma Ayres.
Na
próxima safra, pecuaristas do Cerrado já plantarão pastos com a nova
forrageira. Francisco Laface Neto foi um dos que comprou sementes da primeira
safra destinada à comercialização. O objetivo é plantar 50 hectares na fazenda
Tamboril, que fica em João Pinheiro (MG). A propriedade terá 3 mil hectares, de
um total 50 mil hectares, com a BRS Sarandi e no futuro, se a experiência der
certo, conforme for sendo necessário renovar a pastagem, o capim antigo será
substituído pela nova variedade.
Laface
Neto conheceu a cultivar ao ler uma matéria sobre o aniversário de 50 anos da
Embrapa, a BRS Sarandi foi uma das tecnologias lançadas na ocasião, e
imediatamente ficou interessado. “Pelo o que eu li na matéria, inclusive com
informações do Marcelo [Ayres], de que é um Andropogon, sendo que
o Andropogon já é recomendado para o tipo de solo que nós temos, que
é um solo do Cerrado, que aguenta períodos de seca, que é mais resistente, mais
adaptado, logo fui atrás do material”, lembra.
A
área onde o Sarandi será plantado já foi preparada, com calagem e adubação.
Agora, é só esperar a chuva para plantar. Daqui a uns três meses, o pecuarista
saberá se suas expectativas serão atendidas. “Nossas expectativas são as
melhores. Se a cultivar replicar em campo 80% do que produziu durante a
pesquisa, já está muito bom.” O plano é não só substituir todas as
gramíneas que hoje estão no pasto da fazenda Tamboril, mas as de todas as
fazendas do grupo Agropecuária dos Pratas, sete, no total, que hoje se dedicam
à pecuária de cria.
Da
Planaltina à Sarandi
O programa de melhoramento de Andropogon gayanus começou com a coleta
de sementes das cultivares da Embrapa – Planaltina e Baetí –, oriundas de oito
localidades do Cerrado e do Semiárido brasileiro, mais especificamente dos
estados de Goiás, Tocantins, Minas Gerais e Mato Grosso, e do banco de
germoplasma da própria Embrapa. A seleção partiu de 4.500 plantas e chegou a
150 que apresentaram melhor relação entre folhas e colmos.
Depois
foram priorizadas plantas com florescimento tardio, para estender o período de
utilização da forragem pelos animais. Como consequência, foram obtidas plantas
com porte mais baixo. “Uma das características da Planaltina é que ela tem uma
inflorescência muito grossa. Como os animais não conseguem comer essa parte da
planta, elas continuam crescendo e dificultam o manejo do pasto, diminuem a
qualidade da forragem e limitam o aproveitamento pelos animais. Com a BRS
Sarandi, buscamos plantas com mais folhas e menos hastes, alcançando maior
qualidade nutricional e melhorando o consumo animal”, detalha Gustavo Braga.
O
nome da cultivar faz referência a uma das fazendas onde a Embrapa Cerrados foi
instalada. Também é um regionalismo que significa terra fraca ou estéril, o que
remete a um dos atributos da nova cultivar, que é a de se adaptar e produzir em
solos de baixa fertilidade.
Diversas
espécies, um só pasto
As
forrageiras mais utilizadas pelos pecuaristas brasileiros são do
gênero Brachiaria e Panicum Maximum, que respondem por cerca de
90% das áreas com espécies tropicais. Desde 1990, a Síndrome da Morte do
Braquiarão (Brachiaria brizantha), também chamada de morte súbita, tornou-se
uma ameaça à cultivar Marandu e eliminou pastos inteiros em vários estados da
Amazônia e do Cerrado. Com isso, vários produtores procuraram o Andropogon como
opção para áreas com solos de baixa fertilidade.
Devido
à adaptação e resistência à cigarrinha-das-pastagens e nematoides de solo, o
cultivo do capim-andropogon ocorre de forma alternativa ou complementar às
cultivares de Brachiaria e Panicum em sistemas extensivos
de produção animal a pasto, principalmente em áreas de menor fertilidade das
propriedades.
“A
concentração de poucas espécies e cultivares em extensas áreas, associada à
pequena variabilidade genética dentro de cada espécie, mostra-se um risco para
a pecuária nacional”, alerta Marcelo Ayres. Foi o que aconteceu com a morte
súbita do Braquiarão e com o colapso das pastagens de Brachiaria
decumbens, que estavam sendo dizimadas pelo ataque das cigarrinhas das
pastagens, também na década de 1980.
Uma
das estratégias para lidar com esses problemas é a diversificação de espécies e
cultivares de forrageiras plantadas na propriedade. Essa prática permite obter,
do ponto de vista produtivo, o melhor de cada espécie ou cultivar. “A BRS
Sarandi é uma ótima opção para a diversificação das pastagens em áreas com
ataques frequentes das espécies de cigarrinhas. A cultivar também é resistente
a nematoides, em especial o Pratylenchus brachyurus, o que possibilita seu
uso como planta de cobertura ou em consórcio para o manejo dessa praga”,
ressalta Allan Kardec.
Fonte:
Dia De Campo

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