Ceará teve mais de 6 mil crimes ambientais registrados nos últimos seis anos, aponta levantamento — Foto: Fabiane de Paula/SVM
Dados de boletim da Rede de
Observatórios de Segurança apontam fragilidade das informações sobre crimes
contra meio ambiente e povos tradicionais em nove estados.
O Ceará registrou 6.214 crimes
ambientais entre os anos de 2019 e 2024, conforme divulgado no
boletim da Rede de Observatórios de Segurança. Com dados oficiais de nove
estados brasileiros, a publicação aponta que o monitoramento destes crimes
ainda não é feito de forma padronizada e qualificada.
O levantamento “Além da
Floresta: conflitos socioambientais e deserto de informações” apresenta o dado
de nove estados brasileiros disponibilizados pelas secretarias de segurança
após pedidos feitos por meio da Lei de Acesso à Informação.
Dentre os estados analisados,
o Ceará foi o único que não forneceu dados detalhados sobre os tipos de crimes
ambientais praticados entre 2023 e 2024.
Desta forma, não é possível
saber quais dos registros no estado se referem às violações contra a fauna e a
flora, além de crimes originados pela exploração mineral e pela poluição.
Os pesquisadores da rede
fizeram pedidos direcionados às secretarias de segurança para analisar como são
feitos os registros de crimes ambientais, explicou Fernanda Naiara, doutoranda
em Sociologia na Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisadora da Rede de
Observatórios de Segurança.
Além do Ceará, foram incluídos
no levantamento os seguintes estados: Amazonas, Bahia, Maranhão, Pará,
Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo.
“A gente encontrou um primeiro
achado de que não existe um padrão, nesses nove estados, da forma como a
segurança pública está tipificando estes casos. Então cada estado enviou
números tipificados de formas diferentes, o Ceará foi o estado que nos mandou
um número geral”, comenta Fernanda Naiara.
A pesquisadora explica que a
ausência dos dados detalhados no estado acende um alerta sobre como está o
acompanhamento de crimes considerados complexos, além da formulação de ações e
políticas para combater tipos específicos de violação.
Crimes ambientais podem levar
à detenção e multa
No Ceará, as cidades que
tiveram o maior número de crimes ambientais registrados foram Fortaleza,
Caucaia e Sobral.
Municípios com mais registros
de crimes ambientais:
1. Fortaleza: 1.693
2. Caucaia: 208
3. Sobral: 197
4. Crato: 150
5. Juazeiro
do Norte: 125
Para além da degradação da
flora, os crimes ambientais incluem também violações de direitos das
comunidades tradicionais, como em conflitos envolvendo comunidades indígenas e
quilombolas, como aponta o estudo.
O levantamento traz, também,
os dados com as cidades cearenses que registraram o maior número de crimes
cometidos contra pessoas indígenas.
Municípios com mais registros
de crimes contra indígenas:
Fortaleza: 818
Caucaia: 431
Pedra Branca: 171
Ibiapina: 164
Cascavel: 145
Segundo a pesquisadora, uma
das situações de conflitos envolvendo as comunidades indígenas ganhou
visibilidade em junho deste ano, quando representantes do povo Tapeba
bloquearam dois sentidos da BR-222, em Caucaia. Na ocasião, os manifestantes
denunciaram problemas de acesso causados pelas obras de duplicação da rodovia.
Abertura de estradas,
desmatamento para o agronegócio e construção de hidrelétricas são alguns
exemplos citados como ações legalizadas que afetam diretamente grupos de
pessoas da região.
Conforme Fernanda Naiara,
existe também uma limitação da Lei dos Crimes Ambientais por não incluir alguns
conflitos agrários e violações cometidas contra comunidades tradicionais.
“Por exemplo: quando a gente
está falando de trabalho escravo, muitas vezes ele está relacionado com o crime
ambiental. Então a exploração da fauna e da flora vai gerar tipos de trabalho
escravo, que tem uma outra tipificação do trabalho análogo à escravidão. Então
é um quebra-cabeça que a gente precisa montar para entender a complexidade dos
crimes ambientais dentro desses conflitos”, explica a pesquisadora.
Maior visibilidade para o tema
Dentre possíveis soluções,
Fernanda aponta a necessidade de incluir representantes da sociedade civil no
monitoramento e na execução de políticas públicas sobre crimes ambientais.
Canais de denúncias e de
diálogo institucional também são apontados como garantia de mais segurança para
pessoas e comunidades afetadas.
No mês de abril, o governo do
Ceará criou o Comitê Permanente de Combate aos Crimes Ambientais, que deve ser
presidido pela Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima (Sema).
Conforme a gestão, o objetivo
é coordenar e fortalecer ações de fiscalização e combate a esses crimes, com
foco no combate à poluição e na proteção da fauna, da flora, dos recursos
hídricos e do patrimônio cultural.
Em publicação no Diário
Oficial do Estado, o decreto que criou o comitê cita que ele será integrado por
representantes dos seguintes órgãos:
Secretaria do Meio Ambiente e
Mudança do Clima (Sema)
Superintendência Estadual do
Meio Ambiente do Ceará (Semace)
Batalhão de Polícia do Meio
Ambiente do Estado (BPMA)
Delegacia de Proteção ao Meio
Ambiente da Polícia Civil (DPMA)
Procuradoria-Geral do Estado,
por meio da Procuradoria de Patrimônio e Meio Ambiente.
Outros órgãos convidados como
membros permanentes, segundo o texto, serão o Ibama e o Ministério Público.
O decreto estabelece que
outras instâncias poderão ser convidadas, como autoridades com interface sobre
o tema, autoridades da administração ambiental das esferas federal e municipal
e “autoridades e/ou especialistas de universidades, institutos, fundações,
associações e afins”.
Outros aspectos apontados pelo
boletim Além da Floresta são:
O Brasil teve 41,2 mil crimes
ambientais entre 2023 e 2024, em nove estados analisados.
Quase 70% desses crimes foi
por violações contra a fauna e a flora.
O estado do Pará, que vai
receber a COP30 em novembro, teve o maior registro de conflitos de mineração e
garimpo ilegal, representando 67% do total para este tipo de violação.
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